O trio porto-alegrense SLOW está divulgando o álbum “Lágrimas de Ícaro”, apresentando composições do início da banda, na década de 1980, época em que a ditadura instaurada no Brasil obrigava os músicos a passar suas músicas pelo crivo da censura. Lauro Levandowski (guitarra/baixo e vocal), um dos remanescentes daquela fase, relembrou alguns fatos que fizeram parte da carreira da banda naquela primeira metade de década, quando o Heavy Metal no Rio Grande do Sul dava seus primeiros passos. Formada nos idos de março de 1980, a SLOW passou pelos mesmos problemas da maioria dos músicos da época: não tinha equipamentos decentes e tocavam em qualquer lugar. Instrumentos como um violão serrado ao meio que virou uma “guitarra”, uma bateria improvisada com surdos, tarol e pratos e um piano elétrico, os jovens músicos deram o pontapé inicial do que viria a se tornar uma das primeiras bandas de Heavy Metal gaúchas. Após algumas melhorias, tudo iria ficando mais profissional e as primeiras composições foram criadas, assim como shows em Porto Alegre.
Ouça “Lágrimas de Ícaro” no Spotify:
Já em 1983, Lauro recorda que “falar deste ano é difícil, até pelo número de coisas que aconteceram. Tivemos o trabalho terrível de em meio à ditadura, registrar cada música, enviar letra e gravação, isso sem falar em reservar um teatro por duas semanas...”. O guitarrista se refere ao Teatro do IPE, local que abrigou dezenas de shows na época, e que era carregado de burocracia, afinal, já haviam tocado em diversos colégios de Porto Alegre e foi tudo muito fácil. “A diferença para os dias atuais é que no caso destes shows tinha todo um clima de ordem imposta por medo. As leis continuam as mesmas para coisas graves. Mas o clima que me refiro é de desconhecimento que podíamos ter mais liberdade. No caso da temporada no Teatro do IPE foi outro cenário. O pessoal da administração se surpreendeu quando eu e o Leandro fomos até lá para alugar o teatro por duas semanas. Achamos legal eles aceitarem, mas depois veio uma burocracia terrível para nós com apenas 18 anos. Todos os integrantes tiveram que se registrar na Ordem dos Músicos do Brasil. Depois gravar as músicas em fita K7 e encaminhar com as letras para a censura federal, levou cerca de dois meses para finalizarem as músicas no ECAD. Uma espera interminável para jovens sedentos por música.”
Entretanto, uma das músicas, “Demonólotra”, foi barrada pela censura por ser ofensiva. Lauro conta que poderia ser pior: “Na época TODOS tinham pavor do fiscal do ECAD. Se ele "batesse" em algum bar e pedisse carteirinha de músico e se alguém da banda não tivesse não podia tocar. Em bares que tocamos, como o Rocket 88, o fiscal não apareceu, mas era comum a galera se ferrar. Nas apresentações no Teatro do IPE o ECAD não apareceu, somente a Brigada Militar, mas a administração estava lá e comunicou a legalidade do evento. A liberdade te permite ser criativo. Como ser criativo se já partir do princípio que algo pode ser censurado? É essa a liberdade que não tínhamos.”.
Ouça a versão original de “Incubus e Sucubus”, de 1983 e considerada um dos grandes clássicos da banda:
Ouça a versão original de “Demonólotra”, censurada em 1983:
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